terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Ilha de S. Jorge - Apontamentos para a sua História

Por Candido da Silveira Avellar


Antigo escrivão da admistração do concelho das Vela e antigo ajudante do conservador da HortaHORTA Typ. Minerva Insulana 1902


I

DESCOBRIMENTO


A ilha de S. Jorge, uma das sete ilhas dos Acores de que trata a carta de 2 de Julho de 1439. Ja n'este anno estava descoberta; por quanto, por ella,el-rei D. Affonso 5.o deu licenca a seu tio o infante D. Henrique para as mandar povoar.
Essa carta, publicada no Archivo dos Acores, vol. I pag.5, e do theor seguinte:

«D. Affonso, etc. A quantos esta carta viram fazemos saber que o infante D. Henrique meu tio nos enviou dizer que elle mandara lançar ovelhas nas sete ilhas dos Açores e que se nos aprouvesse que as mandaria povoar. E porque a nós dello praz lhe damos logar e licença que as mande povoar. E porém mandamos aos nossos vedores da fazenda, corregedores, juizes e justiças, e a outros quaesquer que esto houverem de ver que lhas deixem mandar povoar e lhe não ponham sobre allo embargo, e aí não façades. Dada em a cidade de Lisboa 2 de julho. El-Rei o mandou com autoridade da Senhora rainha sua madre como sua tutor e curador que é, e com acordo do infante D. Pedro, seu tio defensor por alle dos ditos rei-nos e senhorios. Pais Rois a fez escrever e sobescreveu por sua mão. Anno do nascimento de nosso Senhor Jesus Christo de rnil e IIIJ C XXXIX, (1439)».

(Chancellaria de D. Affonso V, L. 19 f. 14, na Torre do Tombo).

Outra carta de 5 de d'abril de 1443 isenta da dizima, por 5 annos, os moradores que «estão e vivem nas ilhas dos Açores ».
Transcripta no citado vol. do Archivo dos Açores, eil-a:

«D. Affonso, etc. A quantos esta carta virem fazemos saber que nós querendo fazer graça e mercê a Gonçalo Velho, commendador das ilhas dos Açores, e a todos os povoadores que estavam e vivem nas ditas ilhas, da feitura desta nossa carta até cinco aunos cumpri-dos pelo do Infante D. Henrique meu muito prezado e amado tio que nol- o pedio. Temos por bem e queremos que em o dito tempo não paguem dizima nem portagem nenhuma de quaesquer cousas que das ditas ilhas tragam a estes nossos reinos, com tanto que as não tragam d'alguma outra parte. E porem mandamos a quaesquer nos505 officiaes a quem pertencer e esta carta for mostrada que lhe não consintam levar a dita dizima e portagem nem façam por elio outra alguma sem razão: e a nós praz de Iba quitarmos em o dito tempo como dito é, e aí não façaes. Dada em a cidade de Lisboa em 5 de abril. Por autoridade do senhor infante D. Pedro, tutor e curador do dito senhor rei, regedor com a ajuda de Deus, defensor por elIe de seus reinos e senhorios. Diogo Lopes a fez anno do nascimento de nosso senhor Jesus Christo de mil IIIJ C RIIJ, (1443)».

(Chancellaria de D. Affonso V, L. 27 f. 107 verso, na Torre do Tombo).

Ora desde que temos aquelías cartas, que precisam tão claramente a data em que el-rei mandou povoar as ilhas dos Açores, e isentou os seus moradores que estão e vivem n'ellas da dizima, é evidente que a ilha de S. Jorge, no anno de 1439, estava descoberta e em 1443 havia n'ella habitantes.
Semelhantes factos destroem as differentes opiniões sobre a descoberta e povoação, depois de 1450, que o auctor sr. J. Duarte menciona nos seus apontamentos, referindo-se a outros escriptores.

Estas ilhas foram mencionadas na Livraria Laurentina, de Florença, em grupos distinctos, dando-se ahi ao grupo de S. Jorge, Pico e Fayal, a designação de Insule de Ventura Sive de Columbis.
(Diccionario de Geographia Universal, 1.0 vol. pag. 16, art.o Açores).
E no mappa catalão de 1375 teve a ilha de S. Jorge a indicação de San Zorze, significativa do dia do seu descobrimento. (Archivo dos Açores, vol. X pag. 279).
Parece, pois, que os portuguezes do seculo XV não foram os que lhe deram o nome e que d'estas ilhas já tinham conhecimento pelo infante D. Henrique, que os mandou navegar para estas paragens.

E por tanto de presumir que o nome dado á ilha de S. Jorge, proveio do mappa catalão de 1375, onde foi designada por San Zorze, allusivo ao dia do seu descobrimento, ou então é uma coincidencia muito notavel a descoberta feita pelos portuguezes em egual dia, 23 d'abril.
Em todo o caso ellas estavam despovoadas quando os portuguezes as aportaram, nem a historia apresenta facto algum da existencia de habitantes anteriores á descoberta feita pelos nossos mareantes. Nem tão pouco n'ellas haviam gados de especie alguma.
Tanto o citado Diccionario Universal, por uma sociedade de homens de sciencia, como o Diccionario de Geographia Encyclopedico, por D. José de Lacerda, apresentam a ilha de S. Jorge como a quarta na ordem da descoberta, referindo egualmente que o foi em dia de S. de Jorge, 1450, por Vasco Annes Corte Real, a quem foi doada.

Com relação ao supposto anno da descoberta em 1450, as cartas mencionadas desfazem por completo esse erro, em que tem laborado todos os historiadores. E com respeito á doação, o seu primeiro capitão donatario foi João Vaz Corte Real, filho de Vasco Annes Corte Real, por carta do Duque D. Diogo de 4 de maio de 1483.
E' possivel que Vasco Annes, ou mesmo Jacome de Bruges, como diz Cordeiro na Historia Insulana, algum d'elles, fosse o descobridor, pela proximidade da ilha Terceira, como o Topo, primeiro logar da ilha onde se fez o desembarque. Donatario, porem, é que Vasco Annes Corte Real não foi, mas seu filho João Vaz Corte Real, succedendo a este seu filho primogenito outro Vasco Annes Corte Real, cuja doação se attribue áquelle seu avô.


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